quinta-feira, 14 de julho de 2016
Dostoiévski
Minha cama tá uma bagunça e eu vou dormir bem ali no meio. Vou afastar as roupas com cheiro de cigarro prum canto e me encolher entre tudo que eu tenho tido preguiça de organizar, tirar do caos e colocar em seu devido lugar. Todas as mandíbulas, todos os cortes fundos, todas as beiras de piscinas, todo pensamento excessivo, todas as tortas de limão ficarão ali por mais um ou dois dias. Vou aproveitar. Vou aproveitar o frio e bater queixo entre tudo aquilo que faz meus banhos serem os piores. Depois eu tomo coragem, embolo tudo no armário e continuo fingindo que não há nada de errado. Sozinho. Sozinho, porque eu posso. Sozinho porque eu quis. Dostoiévski me escreveu na ultima página do caderno de matemática, provavelmente. Que fardo escroto.
domingo, 26 de julho de 2015
carrossel
É quase chorável a decisão de seguir em frente. Quero dizer, você conhece pessoas. Você segue sua vida durante um tempo e conhece pessoas e conversa com elas e vocês contam coisas um ao outro e depois de um tempo você esquece de coisas que você disse que talvez na época você quis dizer mas parando pra pensar bem você não queria dizer muitas daquelas coisas e quando as coisas que você disse te alcançam você se pergunta "o quê? Eu disse isso?" e se responde que nunca disse isso e talvez seja verdade. Qual a garantia de que você disse todas aquelas coisas? Nem soa como você. Mas você diz coisas as pessoas e as vezes as pessoas esquecem, as vezes não, mas você disse em algum ponto e isso ficou gravado. Então chega a hora de atravessar a rua da praça pra avenida e você se detém, lembrando de tudo que você esqueceu que disse ou seja não lembrando realmente de nada e você se pergunta se você fez algo de util de todos os rostos que você viu ou de todas as coisas legais ou idiotas que você disse ou poderia ter dito mas você nunca vai saber a resposta porque passou. Passou e as vezes te alcança pra te lembrar que existiu mas passou. Alguns cheiros, algumas cançoes, alguns toques podem te trazer minúsculas amostras do que aconteceu mas tudo isso escapa por entre seus dedos tão lentamente... tão lentamente que você consegue ver mas não sabe o que exatamente está vendo. Você sente vontade de voltar. Os anos passados eram tão mais dourados, né? O que foi embora sempre será dourado. Mas e quando você sabia que os bons tempos estavam acontecendo? Você tinha plena consciencia disso, cara. Você pensava "é isso. Esses são os bons e velhos tempos que vou me queixar de terem passado um dia" mas essa consciência não pareceu mudar muita coisa. Você hoje deseja voltar e aproveitar mais mas será que você aproveitaria mais mesmo ou só ficaria olhando tudo de novo? Olharia. Olharia tudo de novo. Olharia todas as coisas que você disse a todo mundo que você lembra e esqueceu e pensaria "puta merda, como eu sinto falta disso, como eu perco isso todos os dias, como eu erro todas as coisas que aconteceram." Ai você sente seu coração batendo ali, sozinho e de repente, você sente falta de todo mundo.
"Don't ever tell anybody anything. If you do, you start missing everybody."
"Don't ever tell anybody anything. If you do, you start missing everybody."
terça-feira, 26 de maio de 2015
Cactus
Me enveneno com café dia após dia. Ande rápido na rua, desvie dos obstaculos (ou "pessoas", se preferir), contato ocular, contato ocular, vamos!, contato ocular. Olhou, olhou, olhou e lá se foi mais um par de olhos verdes. Em dias assim, amores de calçada sempre me deixam um furo no peito. Em dias como esse o café tem um gosto mais forte do que o de sempre. Lavo o rosto oleoso e estou ali no espelho. Gosto de pensar que sou um cactus. Longo, poucos espinhos e sozinho. Sabe aquele amontoado de cactus no meio do nada? Não estou lá. Um único e pálido cactus no meio de tudo. Pegue um facão, corte meu braço, e beba meu espresso.
Apesar de tudo, crescem flores bonitas de cheiro forte em mim.
Apesar de tudo, crescem flores bonitas de cheiro forte em mim.
terça-feira, 19 de maio de 2015
Focinho
Eu sou um cão. Focinho avante, rabo em riste. Cão andarilho, curioso e cuidadoso. Um bom cão. Olhar vivo, faro minucioso. Fujo do perigo e ladro pro inofensivo. Corro atrás de pneu, louco, com a língua de fora. Não uivo pra lua, não sou idiota. Uivo pros letreiros em neon. Eu trepo. Trepo com cãs, com objetos, com a sua perna. Trepo com o pneu que persigo. Gosto de seu afago. Te olho com olhos doces, sacudo meu rabo e me deito aos teus pés. Rolo na grama, mostro os dentes e rosno pra minha intuição, tudo isso enquanto lambo incessantemente o meu saco. Não sei quanto a você, mas eu sou um cão de luz, de rua. Fuço vida no meio do lixo. Mordo pulgas e ameaças. Corro trotando por calçadas imundas e mijo no seu portão, pois é isso que sou. Ainda sou teu cão. Um cão dos infernos, com uma única e singular cabeça. Certamente, um bom cão.
Quimeras Inomináveis
Toda segunda-feira chove e eu não sei mais dançar.
Ciclo vicioso de reações desagradáveis e indesejadas. É lindo enquanto roda, mas já não roda há anos e eu não sei fazer rodar.
Confio aqui minhas quimeras inomináveis, lindas quando mortas, mas resistem em morrer. Vivem há anos: inacreditável.
Ciclo vicioso de reações desagradáveis e indesejadas. É lindo enquanto roda, mas já não roda há anos e eu não sei fazer rodar.
Confio aqui minhas quimeras inomináveis, lindas quando mortas, mas resistem em morrer. Vivem há anos: inacreditável.
quarta-feira, 6 de maio de 2015
Canção de ninar
Quanta janela fechada. Apartamentos com um cheiro horrível de mofo. Dizem que mofo é um ser vivo, mas me faz pensar na morte. Quando você morrer, sua cara ficará lotada de mofo. Sua virilha também. Entende? Que merda. Fumar um cigarro ouvindo Bob Dylan não tem preço. Antigamente eu não fumava. Nem refrigerante eu bebia. Costumava acordar tão bem...
Essa lata de lixo não tava aqui. Nem esse espelho. Nossos péssimos hábitos acabam se tornando nós mesmos. Vodka é uma merda, porque alguém beberia uma merda dessa? Eu bebo. Eu bebo e vomito pra cima. O lixo deve ter se rastejado pra cá enquanto eu não via, eu não vejo quase nada, poucas coisas prendem minha atenção e eu não consigo dormir, muito menos acompanhado. Ela apaga as luzes, transamos por horas e quando ela não aguenta mais pergunto "terminamos?" ela faz que sim, vira para o lado e dorme, mas eu não. Nunca eu. Pisco longamente e penso porque esse lixo tá aqui na frente do espelho. Tenho tanto medo de lixo. Não ligo pra espelhos mas de lixo eu morro de medo. Se eu fosse a um lixão, teria vontade de me afogar chorando no mar de chorume. Tenho medo de lixo e de gritar. Os gritos em si não me incomodam, mas o ato de gritar sim. Vai que alguém ouve. Tenho pavor.
Fico olhando pro teto torcendo pra desabar na minha cabeça e amassá-la como um pão de queijo sujo. Até que isso aconteça, talvez dê tempo de separar minhas revistas por ordem de lançamento com todas essas mulheres maravilhosas de tão escrotas que são estampadas como algo a ser seguido. Um corpo gostosinho e definido com o miolo mofado, quem ia querer algo assim? Eu quero.
Essa lata de lixo não tava aqui. Nem esse espelho. Nossos péssimos hábitos acabam se tornando nós mesmos. Vodka é uma merda, porque alguém beberia uma merda dessa? Eu bebo. Eu bebo e vomito pra cima. O lixo deve ter se rastejado pra cá enquanto eu não via, eu não vejo quase nada, poucas coisas prendem minha atenção e eu não consigo dormir, muito menos acompanhado. Ela apaga as luzes, transamos por horas e quando ela não aguenta mais pergunto "terminamos?" ela faz que sim, vira para o lado e dorme, mas eu não. Nunca eu. Pisco longamente e penso porque esse lixo tá aqui na frente do espelho. Tenho tanto medo de lixo. Não ligo pra espelhos mas de lixo eu morro de medo. Se eu fosse a um lixão, teria vontade de me afogar chorando no mar de chorume. Tenho medo de lixo e de gritar. Os gritos em si não me incomodam, mas o ato de gritar sim. Vai que alguém ouve. Tenho pavor.
Fico olhando pro teto torcendo pra desabar na minha cabeça e amassá-la como um pão de queijo sujo. Até que isso aconteça, talvez dê tempo de separar minhas revistas por ordem de lançamento com todas essas mulheres maravilhosas de tão escrotas que são estampadas como algo a ser seguido. Um corpo gostosinho e definido com o miolo mofado, quem ia querer algo assim? Eu quero.
E essa porra de teto? Que pesa, treme, mas nunca cai? Eu tô cansado. Eu tenho medo que essa porra de teto caia na minha cab--
terça-feira, 24 de março de 2015
Sobre as Parreiras
Desconstruía a mureta pra erguê-la novamente. Nunca olhava atrás dela, pois não via necessidade. Nem quando não havia a mureta física. Desconhecia-se o que havia atrás da mureta. A mureta, cheia de buracos e falhas, não revelava o que havia atrás. A mureta só existia e passavam jovens parcialmente vestidos e a pulavam com enorme facilidade enquanto desconstruía e erguia-se novamente a mureta cinza de barro duro.
Um dia, surgiu uma marreta carregada por uma figura. Não sei como era a figura, qual era a cor de seu cabelo, o tamanho de suas orelhas, o que ela fazia nas noites de Quinta, não importava. Mas a marreta chegou. E a marreta ria um sorriso largo e arrogante e seus olhos olhavam o nada e estavam completamente vesgos e um tanto vermelho e ela sorria muito. Com um movimento pendular, a marreta começou a estalar a língua. Tloc, tloc, tloc. A marreta era um relógio de pêndulo, veja só. Ela quase encostava na mureta com força tremenda, prestes a dizimá-la. Mas não encostava momento algum. Tloc, tic, tloc, tac, tloc.
E aí desconstruía-se a marreta o relógio o cabelo da mureta o tempo passado e o tempo que tloc viria a tlocar alguma hora e que horas eram? Já nao importava pois o tempo havia sido desconstruído mas logo se erguia de novo assim como a figura e a mureta e a marreta formava cercas e cercas altas de cerca viva cercadas de parreiras vivas de martelinhos e marretas e muretas e murros na figura que desconstruía-se completamente e as vezes até esquecia-se de se erguer mas e daí? Ela era a coisa menos importante da coisa toda e isso se estende até hoje tloc e não afeta em nada sua vida embora talvez devesse mas tloc quem se importa...
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Um dia, surgiu uma marreta carregada por uma figura. Não sei como era a figura, qual era a cor de seu cabelo, o tamanho de suas orelhas, o que ela fazia nas noites de Quinta, não importava. Mas a marreta chegou. E a marreta ria um sorriso largo e arrogante e seus olhos olhavam o nada e estavam completamente vesgos e um tanto vermelho e ela sorria muito. Com um movimento pendular, a marreta começou a estalar a língua. Tloc, tloc, tloc. A marreta era um relógio de pêndulo, veja só. Ela quase encostava na mureta com força tremenda, prestes a dizimá-la. Mas não encostava momento algum. Tloc, tic, tloc, tac, tloc.
E aí desconstruía-se a marreta o relógio o cabelo da mureta o tempo passado e o tempo que tloc viria a tlocar alguma hora e que horas eram? Já nao importava pois o tempo havia sido desconstruído mas logo se erguia de novo assim como a figura e a mureta e a marreta formava cercas e cercas altas de cerca viva cercadas de parreiras vivas de martelinhos e marretas e muretas e murros na figura que desconstruía-se completamente e as vezes até esquecia-se de se erguer mas e daí? Ela era a coisa menos importante da coisa toda e isso se estende até hoje tloc e não afeta em nada sua vida embora talvez devesse mas tloc quem se importa...
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